sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

O que realmente importa

Um dos melhores filmes que já vi!

Pós-Natal. Ouço algumas pessoas dizendo que a cada ano que passa o Natal vai ficando mais sem graça. E é verdade. Não tanto pela falta de condições mas sim pela falta de proximidade das pessoas. Estamos perdendo os contatos, desfazendo laços, distanciando presença. Mas, isso é reflexo do nosso mundo pós-moderno, que não tem mais o que fazer, não tem mais o que descobrir, só redescobrir. Nessas horas a falta de esperança cresce, não vemos mais a luz no fim do túnel. Pequenas coisas acontecem mas não motivam. O que motiva? Nem sabemos mais. Só distrações agora.
E numa dessas distrações de um dia que ainda não acabou – 25 de dezembro, dia de Natal, às 14 horas, almoçando, sem nada pra fazer, mudando ao acaso os canais da TV, paro na BAND, num filme que estava começando. Chama-se“Caiu do céu”. O filme roda em torno de um achado: uma bolsa contendo dinheiro roubado é encontrada por dois garotos, irmãos, que, sem saber ser roubada decidem escondê-la e não contar a ninguém de sua existência. Entretanto a mudança da moeda na Inglaterra, que em uma semana passará a ser o euro, faz com que a dupla busque algum meio de gastar o dinheiro enquanto ele ainda vale algo.
Pelo menos essa é a sinopse. Mas o que foi mais legal de ver, foi como o filme com atores desconhecidos (parceria EUA/Europa) consegue passar diversas mensagens de forma simples e descontraída. Chama a atenção o fato do garoto menor (Damian) conseguir conversar com “santos” (um pouco modernos, digamos assim), assunto aliás que ele domina de forma inexplicável, da mesma forma que seu irmão mais velho (Anthony) entende tudo sobre o mundo capitalista e globalizado, a ponto de decidir melhor que qualquer adulto como aplicar a dinheirama encontrada por eles.
Em vários momentos há frases e citações belíssimas, como quando numa conversa com o próprio São Pedro, Damian aprende sobre a lição da multiplicação dos peixes, que não seria um milagre, mas sim algo simples, pois todos os famintos daquele dia já teriam sua própria comida no bolso. Assim o guardião do céu explica ao garoto que coisas que parecem milagres para nós podem se transformar em coisas simples, mesmo que o garoto tenha dito que nada entendeu. Aí cabe comentar o quanto a nossa fascinação pelo que parece mágico é esvaziada quando passamos para o mundo adulto, e o quanto ainda dependemos de coisas inexplicáveis para sustentar algumas crenças (melhor não entrar em mais detalhes agora, pois este tema costuma ser amplo).
A ingenuidade associada à bondade simples e imatura do garoto torna-o um personagem cativante. Logo cedo ele tem que lidar com questões difíceis para a vida de qualquer adulto, embora ele não entenda como funciona muita coisa, justamente pela sua simplicidade de ver o mundo e as pessoas. Numa oportunidade em que São Francisco de Assis aparece para Damian, ele novamente aprende que não é preciso fazer muito para ser uma pessoa boa, só temos que fazer aquilo que está ao nosso alcance.
Em contrapartida, a esperteza e sagacidade do irmão mais velho faz-nos olhar para o mundo com uma visão realista até demais, algo que beira à obsessão por sair sempre ganhando (ou você pisa ou é pisado). Torna-se aí incômodo no momento em que ele trata o dinheiro como negócio e sai do mundo fantasioso idealizado pelo irmão e cai na triste realidade em que ganha aquele que é mais rápido e mais inteligente e não aquele que não“peca”. Pior é ver que ele se utiliza até do sentimentalismo para apelar (e isso, convenhamos, é próprio das pessoas sem coração), como quando em várias vezes para ganhar alguma coisa ele chora e diz que a mãe morreu (mesmo sendo verdade!). Quem não ficaria com pena de um garoto assim? Eu tenho pena é do diabo quando receber ele no inferno!! hehehe...(brincadeirinha!!)
Uma das cenas em que mostra o quanto o dinheiro pode cegar uma pessoa é o momento em que o pai dos garotos, depois de encontrá-los e descobrir tudo, encontra sua casa roubada em pleno natal e num momento de fúria resolve pegar todo o dinheiro para ele, justificando uma vingança por o “governo não lhe dar a devida segurança”, sendo ele um cidadão honesto que paga seus impostos. Taí a perdição do homem: acreditar que as coisas funcionam como um relógio. Não! Às vezes atrasa, noutras adianta, até acabar a pilha acaba! (é “só” trocar, né?!).
Para piorar a situação há cenas que foram feitas para revoltar, porém são cópias autênticas da realidade. Por exemplo, as ironias do policial “comunitário”, que faz seu trabalho preventivo mas adverte que mesmo assim a casa daquele pai será (ele nem ameniza colocando o termo “poderá” e sim “será”) roubada e o seguro poderá não cobrir. Real? Sim, mas podia poupar-lhes um pouco da verdade, assim a vida ficaria (ou apenas pareceria) melhor. Mas não pára aí. O que dizer dos personagens religiosos (mórmons) ricos, que justificam tudo isso como as graças de Deus. É verdade... o dinheiro parece transformar as pessoas, aliás, as pessoas ficam mais suscetíveis às transformações quando ele aparece...
Enfim, este filme mostra uma realidade que acontece muito: a mudança do ser humano diante da escolha. Se estivéssemos no lugar dos personagens será que não faríamos a mesma coisa? Será que a nossa consciência não pesaria no começo por achar um dinheiro roubado (cujo destino era apenas a queima!) mas depois começaríamos a gastar aos poucos? Afinal, pensaríamos, não vai fazer falta pra ninguém! Talvez não pensássemos no prejuízo no mercado financeiro (quem se importa com isso?) com notas sem valor, mas acontece. Aliás, coisa pequena a gente não nota e não dá valor, dá valor sim a coisas grandes, visíveis. Numa das cenas em que a moça (que procura fazer caridade de forma solitária) na escola tenta convencer os alunos da importância da solidariedade é reforçado o quanto é importante cada um dar um pouco só, porque no final o negócio fica grande e vai ajudar aqueles que mais precisam. Porém, ao ir embora, ela mesma admite ao pai dos garotos que tenta explicar aos alunos confusos sobre tudo isso mas eles continuam confusos.
Só pra fazer uma analogia: recentemente, foi exibida na TV uma reportagem mostrando algumas pessoas que estavam trabalhando com os donativos para os desabrigados das enchentes no Estado de Santa Catarina pegando para si certos objetos que foram doados. Aí a TV mostrou aquilo como “um absurdo, um desrespeito à população brasileira”. Se analisarmos bem, isso é mais comum do que parece. E se nós estivéssemos no lugar desses voluntários? Será que não faríamos o mesmo? Acredito que sim! Nós fazemos quase todo dia! De outras formas, por exemplo, no nosso trabalho, pegamos pequenas coisas ou usufruímos imaginando que é pouco e realmente é, mas não é nosso. É da natureza humana deixar de lado sua humanidade em certos momentos e ser mais instintivo, menos racional. Não que isso seja bom, mas faz parte do nosso crescimento. Errar não é humano? Todo o momento temos que passar por escolhas. E isso implica que uma vez escolhido algo, outra coisa será rejeitada. Mas isso não importa, afinal, tudo depois vai virar pó, seja dinheiro, casa, carro, corpo, o que realmente importa é fazer o bem.

Veja mais informações:

http://cinema.uol.com.br/ultnot/2005/07/07/ult26u19341.jhtm

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